Ah, o amor!
Esse sentimento tão bonito que faz a vida ter mais sentido. Que quando acontece, faz cócegas no coração. Os olhos ficam brilhantes, o sorriso fica largo, o corpo fica pulsante. Ah! Que o amor seja eterno enquanto dure! Amém!
Você já parou para pensar no significado do amor? Desse amor que é sentido quando você se interessa por alguém? Desse amor que te faz querer dividir o tempo, os sonhos, a pizza?
Existem inúmeras hipóteses, teorias, músicas e poemas que dissertam sobre amor. Histórias são contadas e postadas. Relacionamentos se fazem através de um encontro, um reencontro ou um simples clique no celular. Parece que o amor está mais perto, acessível, falado. Está estampado em outdoors e letras decorativas.
Se o amor está tão difundido, aclamado e manifestado, por que então os relacionamentos são mais frágeis hoje em dia?
Você sabe responder essa pergunta assim, de imediato? Para ajudar na reflexão, tente fazer uma pequena viagem. Uma viagem mental, não precisa ter dinheiro e nem fazer as malas. Basta refletir.
Imagine as histórias de amor das pessoas da sua família. Você sabe como os seus pais se conheceram? Se eles se apaixonaram imediatamente ou se um deles teve que investir e cortejar por meses? Eles se casaram? Como era a sociedade naquela época?
Quais os acontecimentos históricos ou a banda que tocava em todas as rádios? Seus pais puderam vivenciar o amor ou sofreram algum tipo de contratempo, ou não aceitação da família?
Agora, vá um pouco mais adiante. Tente viajar para a história de amor dos seus avós. Eles tiveram um casamento duradouro? Seu avô trabalhava fora e a sua avó cuidava da casa e da família?
Será que eles se beijavam na frente dos filhos ou dos netos? Quais cenários políticos e econômicos eles vivenciaram? Que tipo de referência externa eles tiveram sobre o amor?
Esta viagem de caminhar e visitar os amores, ou melhor, as histórias de amor que vieram antes de você, faz ter uma noção de como esse sentimento foi mudando ao longo das gerações. O que era o conceito de amor para os seus avós ou pais, não necessariamente faz tanto sentido hoje.
Muito se mudou na forma de relacionar com seu par e essas mudanças foram acompanhadas por diversas influências, sejam: sociais, tecnológicas, políticas, culturais, ambientais. Estes estímulos externos constroem uma identidade contemporânea e afetam o modo de como os relacionamentos se constroem.
Por um lado, hoje existe o ganho de poder manifestar o amor, falar abertamente sobre, democratizar esse sentimento entre homens e mulheres. Mostrar que se ama não é necessariamente feminino e romântico. O amor vai muito além dos contos de fadas. Ele é real, possível e pode ser vivido.
Por outro lado, parece que o amor perdeu a durabilidade. Pessoas declaram mais o seu amor, mas a relação é mais breve, efêmera. Assim, como a sociedade está mais dinâmica e corrida, os relacionamentos estão mais vulneráveis e rápidos.
É como se a completude estivesse vinculada ao prazer imediato e que qualquer indisposição entre o casal fosse motivo para não investir mais na relação.
O imediatismo inerente na sociedade atual, dita a dinâmica do amor. Tudo é para aqui e agora. Pode até ser uma comparação cruel, mas o amor está sendo consumido como um lanche, um sapato ou um carro.
É como se ele estivesse em uma prateleira, materializado em objetos que vão suprir imediatamente a sua necessidade momentânea.
Por exemplo: você está com fome, seu estômago está pedindo comida, porém você não sabe exatamente o que comer. Pode abrir o seu aplicativo no celular, olhar o cardápio virtual e se apetecer por um prato e clicar; daqui a alguns minutos sua comida chega e você pode se deliciar, prático assim.
Ou você prefere ir ao shopping, ver a variedade de restaurantes que ofertam mais e mais menus atrativos e suculentos, e depois de um tempo pensando, decide optar pela culinária árabe (boa pedida, por sinal); ou ainda, você pode fazer a sua própria comida, ir ao mercado, selecionar os ingredientes e temperos, organizar o mise en place, e se aventurar no fogão.
Este exemplo pode parecer confuso, mas demonstra o caminho para saciar a sua vontade: pode clicar, pode ir ou pode fazer, entende? A escolha vai desenhar o processo no qual está mais a fim de investir o seu tempo.
Com os relacionamentos modernos acontece praticamente a mesma dinâmica, de atuar em cima do desejo de se envolver com alguém: você pode abrir o aplicativo de relacionamento e marcar um encontro com uma pessoa que está próxima a você, assim, de cara.
Ou você prefere ir em um ambiente, tipo um bar ou uma boate, que potencialmente viabiliza conhecer alguém interessante e dali vocês se conectarem. Ou ainda, você começa a observar o que te atrai em alguém, enumera mais precisamente as afinidades e estilos de vida, aproxima, corteja, e depois de um tempo o envolvimento pode acontecer. Percebe que depende do seu investimento de tempo?
E esse tempo, meu caro, anda corrido, voando. Esse tempo anda sem tempo para mergulhar, para sentir. Anda sem tempo para investir o tempo em uma relação. Por isso a praticidade vem sendo mais vivenciada na linguagem do amor.
Existe um termo teórico e atual para designar as novas formas de se relacionar, chamado como Amor líquido. O sociólogo polonês Zygmunt Bauman (1925 – 2017), conceituou o tipo de relacionamento interpessoal na pós-modernidade como líquido.
Essa fluidez se caracteriza por remeter a dificuldade de solidificar as relações e deixá-las rápidas, com alta rotatividade. A forma líquida muda muito rapidamente, sob qualquer pressão.
Partindo deste conceito e associando a liberdade sexual, as pessoas se relacionam com diferentes parceiros em busca de prazer, aumentando significativamente a quantidade, o que não favorece necessariamente a qualidade das relações.
A facilidade de se envolver com alguém está a uma distância mínima de um clique no seu aplicativo de encontro. Hoje, este se estabelece, em grande parte, assim.
Pode ser até uma vantagem quando o envolvimento não ocorre dentro da sua expectativa, e é só bloquear ou excluir o contato. Mas há saúde emocional nesta praticidade das novas relações?
É importante olhar o amor de uma nova ótica, uma nova perspectiva. Como um sentimento, que está sendo modificado e vivenciado diferentemente.
Lembra quando você fez aquela viagem nas histórias de amor dos seus pais e avós? Você acha que a maneira como eles se relacionaram caberia hoje, no seu estilo de vida e na sua relação com o tempo?
Claro que muitas pessoas mantêm a tradição nas relações, e essa fórmula de amar dá muito certo. E, óbvio, que muitas outras pessoas não aderem ao tradicionalismo e amam com essa liquidez. Mas o que é certo e o que é errado? Qual a garantia de não rimar amor com dor?
É, talvez não tenha uma resposta tão assertiva quando o assunto é amor. Existe uma linha tênue para este sentimento ser saudável ou não. Para que ele tenha mais sorrisos e arrepios, do que feridas e lágrimas.
Essa linha passa muito profundamente na maneira como você lida consigo, indo em contato primeiramente com o amor-próprio, e depois com a sua história de vida, as suas experiências amorosas, os estímulos recebidos pela sociedade.
Esse emaranhado vai produzindo o seu comportamento amoroso, e a saúde vem da compreensão do seu processo de vida.
O amor, por mais que seja um sentimento universal e por vezes pintado com um romantismo latente, por mais que ele tenha padrões de manifestação, a gênese dele é bem particular, é muito sua.
Porque não adianta burlar esse sentimento: ele está, ele acontece, ele invade, ele floresce. Mas como esse sentimento funciona pra você? Antes de você amar o outro, qual o sentido dele pra você?
Essa função do amor faz toda a diferença, pois se você pega uma fórmula “pronta” de amores postados no Instagram, de amores que outras pessoas viveram, de amores empacotados e já mastigados, você se distancia dele.
Fazer ele ter sentido pra você, é viver o amor com saúde. É dar chance para que a partir do encontro com a pessoa desejada, vocês construam o amor particular do casal.
Cada pessoa com quem você se relaciona, dita uma nova forma de amor. São os encontros de dois universos distintos, que se juntam e constroem um terceiro universo.
Por isso a importância de se conhecer e dar a abertura para conhecer o outro. Quando a troca afetiva é equilibrada, o amor se torna mais firme.
Talvez, um ingrediente essencial que precisa ser incorporado nos relacionamentos, seja a responsabilidade afetiva. É tratar o afeto que é seu e que é do outro com cuidado, com carinho.
Não banalizar o sentimento e o que foi construído a partir dele. Não descartar o outro no primeiro desapontamento. Ter responsabilidade afetiva é ter cuidado, é conversar, é compreender, é ter empatia.
Amor é uma palavra que está nos quatro cantos do mundo. Amor é um sentimento transformador, que bem vivido, só faz o bem. Viva o amor para agregar e não segregar. Sinta o amor para se ter paz e liberdade. O amor não é uma mercadoria, é um grandioso sentimento.
Por mais que o jeito de amar mude com o passar do tempo, por mais que seja dito sempre e em letras garrafais, por mais que ele seja rápido, que o amor se manifeste na sua vida e na vida de outrem.
Que o amor seja saudável enquanto dure! Amém!